Morar fora não é esse glamour todo que o povo pensa, e aceitar esse desafio não é para qualquer um… A escolha por este estilo de vida exige muita garra, perseverança, coragem e, acima de tudo, desprendimento. Não é nada fácil abrir mãos de certas coisas. É preciso vislumbrar uma vida muito melhor para conseguir fazer isso.
A verdade é que quando uma pessoa que mora fora do seu país de origem conta aos amigos e familiares os pontos positivos do novo lugar e enumera as vantagens e os benefícios, muitas vezes, recebe olhares reticentes ou comentários magoados (senão os dois) como resposta.
É fácil entender o porquê: ao enaltecer as qualidades do lugar que o acolheu, o expatriado, mesmo que sem consciência ou intenção, faz uma comparação, uma crítica, velada ou não, sobre o lugar que deixou, mas que ainda continua sendo a referência do seu interlocutor que, de certa forma, acaba se sentindo, também, julgado ou atingido pela crítica… afinal, ele continua lá!
O fato é que não existe mundo perfeito: se por um lado a nova pátria oferece maiores oportunidades de crescimento profissional, novas perspectivas de vida, um jeito diferente de viver, o antigo também tem seus méritos.
O que o antigo tem que o novo talvez nunca ofereça ou supere?
Eu poderia enumerar dezenas de exemplos, mas vou me limitar a três deles: o aconchego, o conforto e a identidade.
Não por acaso, Elba Ramalho já cantava estar “de volta pro aconchego, trazendo na mala bastante saudade”… Por mais acolhidos que estejamos em nosso novo endereço – e que talvez não tenhamos planos para voltar – é em nosso país, em nossa cidade de origem, que estão os nossos amigos de infância, nossos familiares, nossas referências de cheiros, temperos, sons, temperatura… momentos que constituíram, também, o que somos e como pensamos. Por isso, a saudade é imensa, mas pouco nos remetemos a ela, ao postar nas diversas mídias as fotos internacionais em nossos momentos de lazer.
Conforto é uma palavra muito abrangente: pois se refere tanto ao que se pode adquirir (e eu creio que a maioria dos expatriados têm mais onde está do que teria no lugar de origem) quanto ao que sentimos quando estamos em nossa “zona de conforto” (perdoe minha repetição).
Que sentimento é esse que nos abandona, muitas vezes, no exterior? Cada um tem seu nível de “desconforto”, em diferentes ocasiões. Compartilharei os meus:
Não saber em tempo integral o que se passa a minha volta, por exemplo. Seja pelas limitações da língua, seja porque não tenho o background (conhecimento anterior) para entender aquilo que é dito; ou aquilo que não é dito, e que eu deveria “captar”.
Viver em uma espécie de “bolha”, tentando participar ativamente da sociedade onde vivo, dos diversos grupos, mas com aquela sensação persistente de que eu não passo “invisível” quase nunca, seja pelo meu aparência, seja pelo meu sotaque ou ainda pelos meus quase imperceptíveis gestos (pelo menos para mim) que fazem com que as pessoas me identifiquem como buitenlander (aquele que é “de fora”).
O sentimento de identidade, que dialoga tão intimamente com o conforto. Identidade que nos faz procurar por nossos “semelhantes”, que nos aproxima e nos torna amigos de pessoas a quem talvez nunca déssemos a menor chance se as tivéssemos conhecido no nosso país de origem, que nos faz querer falar a nossa língua materna, por mais fluentes que sejamos em outro idioma.
O que desejo enfatizar é que, por mais que estejamos “longe de casa”, por mais que as razões que nos fizeram deixá-la sejam as mais diversas, a pátria-mãe sempre será uma referência, terá um endereço que sabemos de cor e uma essência que é nossa.
Nós, brasileiros morando no exterior, muitas vezes tecemos severas críticas ao governo vigente, às condições econômicas e sociais do nosso país e à falta de recursos para a população que lá está… mas isso não quer dizer que sentimos um desprezo profundo pela nossa pátria. Pelo contrário: frequentemente, o que nos move é pura frustração e pessimismo, pois gostaríamos de encontrar “lá” (ou “aí”) as mesmas condições que encontramos “aqui”. Vou além: queríamos que “lá” (ou “aí”) as pessoas tivessem acesso a tudo o que temos aqui.
Em referência ao título do post, este é o “preço” que todos nós expatriados precisamos pagar. E não é barato, mesmo ganhando em euro! Não pense você, porém, que estou em um momento nostálgico da vida; tampouco lamentando ou maldizendo a minha sorte. Sou grata por tudo o que conquistei e feliz pelas chances que aparecem a cada dia, mas isso não quer dizer que eu não reconheço as coisas boas de que tive que abrir mão ao vir para cá.
Enfim, o almoço “sofisticado”, “chique”, “importado” esfria… sacia… torna-se trivial, arroz com feijão… e nos torna saudosos e faminto, ansiosos por uma boa e simples comida quentinha no aconchego do lar.
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