Dali a pouco, você de repente percebe que, apesar de uma haver sempre uma multidão se deslocando em múltiplas direções, quase não há barulho… seja de buzina, de gritos, de conversas animadas… o japonês é um povo silencioso ao extremo. Aquela coisa de fazer os movimentos com leveza, de pisar suave, de falar num tom de voz brando… uma maravilha para a gente, que vem de uma cultura em que se fala alto, rápido e demais…
Um aspecto que já havia me chamado a atenção na visita anterior, foi a discrepância em um equipamento básico da vida do ser humano: o vaso sanitário.
Em muitas lojas, estações de trens e em hotéis, é muito comum encontrar um vaso sanitário com equipamento digital. A pessoa usa e depois faz a opção por ducha higiênica para os dois “serviços” e pode modular a força do jato da água e até fazer a opção de acordo com o gênero (tem uma figura indicando a ducha para mulher).
Alguns modelos disponibilizam um barulhinho de água corrente no momento em que você senta, de maneira a abafar os ruídos naturais. Nessa hora você não tem como não pensar que o japonês vai mesmo no requinte do detalhe!
Por outro lado, em algumas estações, museus, parques públicos em geral, você pode se deparar com aquele vaso sanitário de chão, que deixa você na maior dúvida se vale mais a pena tentar o agachamento ou arriscar e contar com a sorte de encontrar um no padrão “ocidental”…
Minha cunhada me explicou que as pessoas que usam, consideram-no mais higiênico, pois não precisa sentar onde todo mundo já sentou (ou respingou, o que é pior!), mas exige uma certa dose de preparo físico…E quem tem problema de joelho, como fica?! E ainda tem a direção certa em que você deve se posicionar para usar: tem que ser de frente para a parte mais larga… eu nunca imaginaria isso!
Confesso: experimentei (usar mais do que duas vezes conta como experimentar??? hahaha), mas ficava morrendo de medo de pisar lá dentro na hora de sair do cubículo… Ah, e a válvula tem que ser acionada com o pé… uau! É quase um balé!
E que fique muito claro que não estou zoando ou fazendo qualquer juízo ou julgamento… estou apenas compartilhando as curiosidades que vivenciei…
Uma outra particularidade que achei muito curiosa: muitas pessoas usam a bicicleta como meio de transporte. Porém, em muitos bairros e avenidas movimentadas, o ciclista ocupa o mesmo espaço que o pedestre.
Eu não vi ninguém colidir; parecia mesmo uma dança ensaiada em que cada um sabe o próximo movimento. Eu tomava uns sustos, pois não percebia a aproximação dos ciclistas. Meu manual de sobrevivência: não parava bruscamente nem mudava de direção… traçava uma linha imaginária e não parava sem antes olhar pra trás.
E vi um pouquinho da Holanda por lá… gente de todas as idades pedalando com vigor, mães malabaristas carregando filhos e compras, mulheres pedalando de salto alto, executivos indo ou voltando do trabalho de terno…
Uma mania que peguei: entrava num trem ou num metrô lotados e começava a procurar quantos pares de calças jeans eu conseguia achar. Às vezes, encontrava um! Entre mulheres, de qualquer idade, o uso de saias e vestidos era o mais comum. Entre os homens, calças de tecidos variados, mas tendendo pro formal.
Sim, eu sei que essas informações não são de utilidade pública, podia até nem colocar no post, mas achei bastante interessantes.
Ah, e o uso de acessórios infantis pendurados nas mochilas (chaveiros, pelúcia etc.) era comum até entre adultos.E por falar em acessórios, dois deles são itens básicos: sacolinhas de pano para as mulheres (além da bolsa normal) e quadradinhos de toalha para todos. O japonês detesta ficar suado e tem sempre consigo um paninho para enxugar o rosto, as mãos… Eu estive lá no final do verão e fiquei surpresa com as altas temperaturas que peguei por lá. Parecia Brasil!
No quesito locomoção em escadas (rolantes ou não), quem não está com pressa deve se manter à esquerda, pois a direita é reservada a quem quer passar correndo. O mesmo se aplica para deslocamentos de um ponto a outro, como nas estações, por exemplo. Todos seguem a mesma direção ao sair de um trem, por exemplo, ou para andar pelos corredores ou mesmo para subir e descer escadas.
Ah, e por falar em estações de trens e metrôs… ainda que a plataforma esteja lotada e que os vagões estejam cheios, o povo japonês aguarda em fila, respeita a ordem de chegada e espera o desembarque dos outros passageiros para, depois, começar a entrar nos vagões. Uma verdadeira aula de respeito e cidadania. Ninguém empurra o outro, ainda que imponha a própria entrada no vagão, fazendo com que o outro seja obrigado a “dar um passinho à frente” e ficar completamente enlatado junto aos demais.
Juro: já peguei muito ônibus lotado na juventude, já peguei um trem absolutamente abarrotado em Cinque Terre, mas nunca tive uma experiência tão sufocante, quanto no dia em que resolvi voltar do centro de Tóquio na hora do rush para a casa do meu irmão, em Hiratsuka. Eu me senti uma sardinha em lata! Fui grande parte do caminho sem conseguir me mexer.
Aliás, foi mesmo em trens e metrôs que eu tive os momentos mais engraçados da estadia. Eles são verdadeiros laboratórios para estudos dos comportamentos humanos. Vale a pena sentar num vagão e, perdão do trocadilho, vagar sem rumo pelos dois extremos da linha só pra ficar de butuca espiando todo mundo: como tem gente de todo tipo e cada um na sua… se um espia o outro, faz com uma discrição ninja.
Eu, curiosa que sou, fazia um esforço supremo pra não ficar olhando todo mundo o tempo todo, mas era inevitável: o japonês é um povo muito, mas muito peculiar. Dá uma vontade danada de olhar! E, engraçado, que o ET ali era eu: num mar de orientais, era difícil achar alguém com o meu biotipo. E ninguém ficava me encarando. Povo evoluído!
Cada pessoa é única, assim como são as nossas impressões. Duas pessoas viajando juntas podem ter visões completamente distintas da mesma situação. Para mim, é aí que reside a tarefa de compartilhar experiências de viagens. Podemos ocupar o mesmo espaço, no exato momento e ter impressões completamente opostas. E eu acho isto o máximo!
Quando estive no Japão em 2013, muitas dessas coisas me passaram despercebidas. Eu só reparei nelas agora. Pode ser que eu não as tenha, realmente, notado. Pode ser que eu tenha mudado. Eu não tenho dúvidas de que se houver uma próxima vez, muita coisa estará mudada. Seja por lá, propriamente, seja dentro de mim. Está aí a beleza de ver, rever, descobrir, redescobrir… e sempre se encantar.
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